segunda-feira, 12 de julho de 2010

Nada nunca foi tão bom

To com medo. Você é perfeito pra mim. Muito. Todo. Da voz ao tamanho do pau. Agora eu não acho nada, não penso nada, não quero mas saber de nada. Me abandonei em você!


(Do filme Nome Próprio)

sábado, 3 de julho de 2010

Por não estarem distraídos



Havia a levíssima embreaguez de andarem juntos, a aglegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava á frente, e ter essa sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria e peso á levíssima embreaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas , ás vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhavam o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles adimiravam estarem juntos!
Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinha prestado atenção. só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.

Clarice L.

Sem aviso

Tanta coisa que eu não sabia. Nunca tinham me falado, por exemplo, deste sol das três horas. Também não me tinham falado deste ritmo tão seco, desta martelada de poeira. Que doeria, tinham me dito. Mas que o passarinho que vem para minha esperança do horizonte abra asas de águia sobre mim, isso eu não sabia. Não sabia o que é ser sombreada por grandes asas abertas, um bico de águia inclinado rindo. Quando nos albúns de adolescente eu respondia com orgulho que não acreditava no amor, era então que eu mais amava. Também não sabia no que dá mentir. Começei a mentir por precaução, e ninguém me avisou do perigo de ser precavida, e depois nunca mais a mentira descolou de mim. E tanto menti que comecei a mentir até a minha própria mentira. E isso - já atordoada eu sentia - era dizer a verdade. Até que decaí tanto que a mentira eu a dizia crua, simples, curta: eu dizia a verdade bruta.

Clarice Lispector

quinta-feira, 1 de julho de 2010

"Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos."
Clarice Lispector